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ENTREVISTA

Robson Fleming Ribeiro

Professor de Metalurgia e Materiais do Campus Corumbá
por Juliana Aragão publicado: 23/02/2017 13h32 última modificação: 23/02/2017 13h32

Declaradamente apaixonado pela ciência que estuda as propriedades dos materiais, o professor Robson Fleming Ribeiro, 34, é daquelas pessoas que prendem a atenção de qualquer ouvinte ao falar sobre as pesquisas que desenvolve. Em vinte minutos de conversa, ele dá uma aula sobre a composição da fibra de carbono e a aplicação desse material na indústria.

Natural de Itanhandu (MG), Robson trocou a morraria mineira pelo cerrado sul-mato-grossense em 2003, quando veio estudar Física na UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul). O mestrado e o doutorado foram feitos no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Foi lá que o físico começou os estudos com a Poliacrilonitrila (PAN), um material precursor da fibra de carbono.

A experiência na área rendeu ao jovem doutor uma das cadeiras de membro honorário do IGTPAN (Instituto Granado de Tecnologia da Poliacrilonitrila), uma instituição privada que conta com a parceria de universidades para desenvolver pesquisas sobre a PAN, a fibra de nome complicado que precede a fibra de carbono.

No ano passado, todo esse conhecimento veio parar no Campus Corumbá do IFMS (Instituto Federal de Mato Grosso do Sul), onde Robson assumiu a vaga de professor da disciplina de Metalurgia e Materiais. Nas aulas, o físico faz os estudantes do curso técnico integrado em Metalurgia e do superior de Tecnologia em Processos Metalúrgicos pensarem sobre os materiais que compõe estruturas metálicas.

Olha, o assunto parece complicado, mas é bem interessante! Confira no bate-papo a seguir.

Professor, tanto em seu mestrado quanto no seu doutorado, o senhor desenvolveu pesquisas com o precursor da fibra de carbono. Que material é esse?

Primeiro, eu gostaria de falar um pouco sobre a fibra de carbono. As pessoas falam: “o quadro da minha bicicleta é feito de fibra de carbono, a estrutura do meu carro é feita de fibra de carbono”. Mas, o que é a fibra de carbono? É um material de alta performance, ou seja, com muita resistência, leve e, por isso, é tão interessante a aplicação dele hoje em dia. Nos boeings, parte da estrutura é feita de compostos de fibra de carbono porque compensa o investimento. Você tem a resistência que deixa o avião mais leve e, consequentemente, o consumo de combustível diminui. No futuro, a tendência é reduzir o custo desse tipo de material e, quem sabe, utilizá-lo em carros populares e equipamentos que não sejam somente de alto desempenho.

Nossas pequisas mostram que, para se produzir a fibra de carbono, você precisa ter uma fibra precursora, e 90% da produção mundial dessa fibra precursora é feita por um polímero acrílico e claro chamado de poliacrilonitrila (PAN). O monômero dele, que é a matéria-prima do polímero, vem do petróleo e o Brasil, infelizmente, está engatinhando nessa área. É um material de altíssima estratégia para o país porque é resistente e leve, mas infelizmente nós não temos nenhuma empresa que produz a fibra de carbono. A gente depende de importação, o que não é tão simples porque é um material que pode ser usado para fins militares. E para o Brasil desenvolver a fibra de carbono, antes tem que produzir o quê? A fibra precursora. Há um bom tempo tentamos desenvolver esse tipo de fibra. Já estamos em uma escala laboratorial e quem sabe, no futuro, a gente consiga atingir uma fibra de carbono de boa qualidade.

Qual o diferencial de seus estudos nessa área, professor?

O mundo produz essa fibra [poliacrilonitrila] por um processo muito direcionado a solventes orgânicos, que são tóxicos. O grande despertar da nossa pesquisa é que a gente usa a glicerina como um dos plastificantes para a fibra. A glicerina, para quem não sabe, é um subproduto do biodiesel. Você produz biodiesel e 10% do que sobra vira glicerina. Hoje em dia, devido à alta demanda da produção de biodiesel, existe um passivo ambiental absurdo que é a glicerina. Tem tanta glicerina que não se sabe onde utilizar. A gente fala que a nossa fibra tem um selo verde. Quem sabe a gente ainda consiga produzir uma fibra de carbono e ainda virar uma fibra de carbono verde.

Por conta de toda a sua experiência no estudo com essa fibra precursora, recentemente o senhor se tornou membro honorário do IGTPAN (Instituto Granado de Tecnologia da Poliacrilonitrila), dedicado exatamente a esse tipo de pesquisa. Como é o trabalho dessa instituição?

O IGTPAN surgiu no ano passado, e tem como fundador um dos grandes professores que eu tive, Nilton Granado. Hoje em dia, é lá que está grande parte do conhecimento sobre essa área. O que o Instituto faz? Faz parcerias com universidades como USP, Unesp e, principalmente, com o ITA, concedendo bolsas para alunos de iniciação cientifica, mestrado e doutorado. Ao buscar esses alunos dentro da academia e usar toda a infraestrutura que tem na própria empresa, foi possível montar esse Instituto para o desenvolvimento das fibras e das futuras fibras de carbono. Tem uma área de síntese do polímero, e como eu realizei pesquisas bem significativas sobre o PAN e fui um dos iniciadores - já faz 8 anos que trabalho com eles -, o professor Nilton me colocou ao lado de pessoas como o professor Luiz Cláudio Pardini, uma das referências na área de carbono no mundo. Foi uma surpresa pra mim, mas foi um grande prazer e uma grande honra na minha carreira acadêmica e como pesquisador.

É possível trazer essas pesquisas com o precursor da fibra de carbono para o IFMS? Existe algum projeto nesse sentido?

O Campus Corumbá, como todos sabem, está instalado em sede provisória. Nós temos equipamentos de altíssima tecnologia, mas devido à falta de espaço físico, a gente tá muito limitado para utilização. Nós temos um equipamento que estuda propriedades elétricas de vários tipos de materiais e eu, em conjunto com o professor Felipe, doutor da área de materiais cerâmicos, estamos começando a estudar as propriedades elétricas da fibra percursora. Já é um início para levarmos esse tipo de pesquisa para o IFMS, mas acredito que quando a gente conseguir montar o laboratório com os equipamentos de alta tecnologia que nós temos lá, vamos conseguir vários projetos nessa área, que não tem muita pesquisa no país. Alguns nichos estudam esse tipo de material, mas são poucos. Então, eu acredito que possa gerar resultados bem expressivos para o Campus Corumbá nessa área.

O senhor dá aulas de metalurgia e materiais para estudantes do técnico integrado e do ensino superior do Campus Corumbá. Fale um pouco mais sobre essa disciplina...

Sobre a ciência dos materiais eu sou muito suspeito pra falar porque sou apaixonado por materiais. Faz muito tempo que estudo essa área e ela engloba o nosso dia a dia, desde a roupa que você utiliza até estudar um material de altíssima performance e entender como funciona a estrutura de um carro de Fórmula 1 ou de um prédio. Eu dou o exemplo: aqueles prédios lindos em Dubai, só é possível construir esses prédios porque foram desenvolvidos materiais de mais performance para poder ter esse tipo de estrutura. Eu abordo todas as classes da engenharia, que são os materiais cerâmicos, os poliméricos - que é bem minha área -, os materiais metálicos, que eu direciono bastante porque é um curso de metalurgia. Nós temos que estudar bastante os materiais metálicos e os compostos, que é a união de dois ou mais materiais. O que é a ciência dos materiais? É estudar a microestrutura, ou seja, é algo que a gente não enxerga e precisa entender para explicar o comportamento macroestrutural dos materiais, que é o comportamento a olho nu. Por que a gente aquece muito esse material e ele não derrete, não funde? Por que esse material suporta altíssimas temperaturas e outro não? Por que esse material suporta uma resistência mecânica muito alta e o outro não? Essa é a área da ciência dos materiais, em que a gente estuda as propriedades dos materiais.

Existe o interesse dos estudantes com os quais tem contato no sentido de que eles também desenvolvam pesquisas? O senhor pretende ser orientador de projetos?

Sem dúvida. Quando entrei no Instituto Federal, fiquei impressionado. Participei de duas bancas e, em uma delas, o aluno me apresentou resultados de equipamentos de alta tecnologia, de microscopia eletrônica de varredura, de raio-x, de florescência. Eu falei: meu Deus, um aluno de ensino médio estudando isso, é sensacional! Não imaginava que era esse nível. O IFMS é uma escola diferenciada no Brasil. Eu fui fazer iniciação cientifica e aprender o que é pesquisa na graduação, e aqui você vê estudantes de 16 anos indo para o laboratório e trabalhando num equipamento de alta tecnologia e desenvolvendo pesquisas. É aprendizado pro resto da vida deles!.

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Assunto(s): Professor