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Meio Ambiente

Pesquisas buscam agregar valor a resíduos industriais

Estudos desenvolvidos nos campi Coxim e Corumbá do IFMS criam alternativas para a utilização de rejeitos da agroindústria e de empresas das áreas de mineração e siderurgia, respectivamente.
por Juliana Aragão publicado: 29/06/2018 14h22 última modificação: 29/06/2018 16h23

Em Corumbá, professor e estudantes criaram uma argamassa feita com pó de balão - Foto: Felipe Senna

Dar uma destinação a resíduos de indústrias, agregar valor a esses rejeitos e, consequentemente, contribuir para a preservação do meio ambiente. Esses são os objetivos de dois projetos de pesquisa desenvolvidos por professores e estudantes da iniciação científica do Instituto Federal de Mato Grosso do Sul (IFMS).

Em Corumbá, o estudo tem como foco os resíduos produzidos por empresas dos setores da mineração e siderurgia instaladas na região. São analisados os rejeitos da Mineradora Vale e da indústria siderúrgica Vetorial.

O orientador da pesquisa, Robson Ribeiro, destaca que só na indústria siderúrgica ficam estocadas, todos os anos, sete mil toneladas de pó de balão, um resíduo sólido composto por minério de ferro e carbono, entre outros elementos.

"Na pesquisa, nós utilizamos esse resíduo na produção de uma argamassa para ser usada na construção civil. Substituímos 30% da areia pelo pó de balão, e ao substituirmos os agregados da argamassa como areia, brita e cimento, cujas extrações geram danos ambientais, oferecemos uma alterativa e agregamos valor ao rejeito", explicou Ribeiro.

O estudo avalia propriedades físicas e mecânicas da argamassa com pó de balão. "Além do peso, são analisados aspectos como a compreensão, ou seja, quanto essa argamassa resiste, absorção de umidade e porosidade".

No caso da mineradora, são analisados o fino do minério de ferro e o fino do manganês, que se acumulam nas barragens dos locais de extração. "Verificamos que a argamassa fica mais pesada, mas pode ter aplicação em calçadas e estacionamentos, por exemplo", explicou o orientador da pesquisa.

No segundo semestre, a pesquisa será ampliada com a análise química da argamassa produzida com pó de balão. Os estudos serão feitos nos laboratórios do campus do IFMS, onde estão instalados equipamentos de ponta, como difração e fluorescência de raios x.

Agroindústria - Em Coxim, a pesquisa do IFMS é sobre o reaproveitamento do bagaço da cana-de-açúcar, um rejeito produzido pelas indústrias sucroalcooleiras da região, para a produção de um polímero que pode ser utilizado como matéria-prima por indústrias de vários segmentos.

De acordo com o estudo, são produzidas anualmente no mundo mais de 50 milhões de toneladas de bagaço da cana, resíduo que pode ser reaproveitado de várias formas. Em algumas usinas, por exemplo, é com esse rejeito que se produz a energia elétrica necessária para a produção de açúcar e álcool.

A orientadora, Felícia Ito, explica como surgiu a ideia de estudar os resíduos das indústrias da Região Norte.

"Em 2014, uma estudante de Química me pediu orientação para um trabalho de conclusão de curso. Como sempre fiz pesquisas sobre aproveitamento de subprodutos, aceitei e começamos, então, o processo de transformação do bagaço em celulose e, depois, em um polímero que pode ser usado na produção de embalagens, cápsulas de medicamentos, revestimentos de carros, computadores", explicou a professora.

O polímero, segundo Felícia, também pode ser aproveitado por outras indústrias. "Nós usamos microrganismos específicos que levam à produção de ácidos orgânicos. Dessa forma, o polímero pode ser usado também pelas indústrias farmacêutica, alimentícia e até química", destacou.

A orientadora explica que um outro subproduto bastante descartado na região, a castanha de caju, também é utilizado no estudo. "A gente retira o líquido da castanha de caju e agrega ao polímero produzido a partir do bagaço da cana, e isso é um diferencial da pesquisa", pontuou Felícia.

Em Coxim, o bagaço da cana e o líquido da castanha de caju são usados na produção de plástico - Arquivo Pessoal

Experiência - Nas duas pesquisas, estudantes do IFMS atuam como bolsistas da iniciação científica. Durante o ano de vigência da bolsa cada um recebe 100,00 R$ por mês para desenvolver os estudos.

Vinícius de Arruda, 19, aluno do sétimo semestre do curso técnico integrado em Metalurgia, é quem faz as análises físicas e mecânicas dos resíduos da indústria siderúrgica instalada em Corumbá. O jovem conta que a iniciação científica o fez enxergar o mundo de outro jeito.

"Antes, eu achava que pesquisa era coisa de ensino superior e que só era desenvolvida em países do primeiro mundo. Quando entrei no projeto, comecei a estudar até em outros idiomas. Estou sempre atrás de novos ensaios e técnicas e de publicações relacionadas ao tema. A pesquisa me levou de Corumbá para o mundo", comemorou Vinícius.

O estudante explica que, além de fazer o desempenho no curso melhorar, a pesquisa proporcionou experiências nunca vividas antes. Na Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace) deste ano, o projeto ganhou o Prêmio Poli Cidadã. Além de menção honrosa, Vinícius foi convidado a passar o mês de julho na Universidade de São Paulo (USP).

O jovem que iniciou o curso sem saber o que era metalurgia mudou até os planos depois que ingressou no IFMS. "Sempre quis fazer Medicina, mas mudei de ideia. Agora, quero fazer Engenharia Mecânica. Vou fazer um concurso para oficial da Aeronáutica. Se eu for passar e for chamado, vou estudar em Guaratinguetá, São Paulo", contou.

Ana Carolina Landfeldt da Silva, 17, aluna do quinto semestre do curso técnico integrado em Alimentos do Campus Coxim, está envolvida com a pesquisa que reaproveita o bagaço da cana-de-açúcar desde que ingressou no IFMS.

"Sempre fui muito curiosa e quando eu descobri com a professora Felícia que dava pra reaproveitar o bagaço da cana para a produção de plástico, achei genial", relembrou a estudante.

A curiosidade, no caso específico dessa pesquisa, surgiu nas viagens que Ana Carolina fazia entre Coxim e Campo Grande logo que começou a estudar no IFMS. "Da rodovia, eu via o bagaço da cana nas usinas e pensava: o que será que eles fazem com isso? Será que vira lixo?".

Ana Carolina é tão apaixonada pelo assunto que fala como uma jovem pesquisadora sobre o assunto.

"Um diferencial desse estudo é que nós utilizamos o LCC, o óleo essencial da castanha de caju para agregar ao biopolímero. Esse líquido é facilmente absorvido pelo solo, dessa forma podemos dizer que estamos criando um plástico biodegradável, ou seja, que se desintegra mais facilmente na natureza".

Com tanto conhecimento sobre o tema, a estudante apresentou o projeto no encontro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) de 2017 e acabou selecionada para participar da Mostra Brasileira de Ciência e Tecnologia (Mostratec) no mês de outubro, em Novo Hamburgo (RS).

O sonho de fazer Medicina ficou pra trás. Agora, Ana Carolina quer estudar Química e fazer pesquisa pelo resto da vida. "Eu me sinto mais confortável no laboratório do que na minha própria casa, chego às 7h e saio às 22h. Minha mãe até fala: perdi minha filha para o IFMS". (risos)

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